Publicada em 29/11/2025 às 09h14
PORTO VELHO (RO) - As eleições de 2026 em Rondônia já não se desenham como batalha ideológica, mas como um exercício de matemática. O que decidirá o resultado não é o conservadorismo, nem a retórica anticorrupção, tampouco o agronegócio — ainda que todos tenham peso estrutural. O fator definitivo mora em outra gaveta: o voto da esquerda. Minoria que não governa, mas elege; pequena demais para vencer por conta própria, grande o suficiente para definir quem vence quando o jogo chega ao segundo turno. É o santo graal. Quem souber conquistá-lo governa. Quem ignorar, assiste da arquibancada.
Essa lógica se consolidou num estado profundamente conservador. Rondônia foi o único do país em que Bolsonaro venceu Lula em todos os 52 municípios em 2022, alcançando 70,66% dos votos no segundo turno. A esquerda local encolheu a tal ponto que, na mesma eleição, não elegeu deputado federal e colocou apenas uma deputada estadual na Assembleia. Ainda assim, essa fatia minoritária — estimada entre 20% e 30% dependendo do pleito — tornou-se a balança que define o desfecho quando a direita interna se divide. E a direita rondoniense, em 2026, chega pulverizada.
Essa variável não é teoria — a história recente prova. Em 2022, o senador Marcos Rogério (PL), o “pitbull de Bolsonaro”, perdeu o governo para Marcos Rocha justamente na fase final. Não foi o eleitorado bolsonarista que lhe faltou; foi o progressista. A esquerda preferiu Rocha, visto como menos radical. Rogério aprendeu da forma mais dura: sem esse voto, não se atravessa a porta do Palácio Rio Madeira. Se quiser vencer agora, terá de fazer malabarismo: suavizar o discurso sem perder o eleitor que gosta dele justamente por não suavizar nada. Difícil? Sim. Impossível? Não. Até aqui, lidera pesquisas e entra na corrida como favorito — mas favorito não leva a taça por decreto. É favorito até a urna abrir.
A disputa ganha contornos ainda mais complexos porque o voto progressista não busca identidade ideológica — busca evitar o pior. Esse eleitor rejeita radicalismos, desconfia de discursos inflamados e tende a migrar, no segundo turno, para quem transmite equilíbrio, respeito institucional e alguma abertura ao diálogo com o governo federal. Em 2018, parte desse público se absteve ou anulou, contribuindo indiretamente para a larga vitória de Rocha sobre Expedito Júnior. Em 2022, o mesmo segmento migrou para Rocha contra Rogério. Em 2026, a lógica permanece: vence quem conseguir parecer menos hostil aos olhos dessa minoria decisiva.
O deputado federal Fernando Máximo (União Brasil) ocupa outra prateleira. Flerta com o bolsonarismo, mas não se lambuza. Mantém o pé no conservadorismo clássico, ventila valores da direita, mas dialoga sem espantar quem não quer guerra. Se for ao segundo turno, pode se tornar a opção palatável para eleitores progressistas que buscam o menos — menos polarizado, menos inflamado, menos ligado à extrema-direita. Vai depender do adversário. Em um cenário com Rogério, pode virar válvula de escape; em outro, pode ser apenas mais um conservador na disputa. Pesquisas já o colocam empatado tecnicamente com Rogério em simulações de segundo turno, e em cenários sem Rogério ele chega a liderar.
O prefeito de Cacoal Adaílton Fúria (PSD) surge com energia de gerador. Foi reeleito com mais de 80% dos votos em Cacoal, exibe ritmo, marketing e discurso desenvolvimentista. Mira o estado com fome política. Declara admirar Cassol, Ratinho Jr e João Campos — uma síntese curiosa entre tradição e juventude administrativa. Contou que conversou com Marcos Rogério, mas “não deu liga”. Tenta construir uma ponte com o governador Marcos Rocha para a disputa ao Senado. Se for ao segundo turno, pode atrair naturalmente o eleitor de esquerda, que não precisa se apaixonar — apenas se satisfazer com o menos hostil. Em política, nem sempre vence o mais amado; muitas vezes vence o mais tolerado. Seu desafio, porém, é decidir se entra na corrida pelo governo ou se fecha aliança para outros projetos.
O ex-prefeito de Porto Velho Hildon Chaves (PSDB), por sua vez, seria o candidato ideal para abocanhar esse eleitorado. Executivo, moderado, avesso a guerra cultural, passou oito anos governando Porto Velho sem carregar consigo o cheiro da disputa ideológica. É o tipo de nome que a esquerda aceitaria por pragmatismo — não por identidade. Mas sua própria trajetória recente impõe dúvida. Em entrevista, afirmou que “forças ocultas conspiram” contra sua chegada ao governo. O candidato perfeito para receber o voto progressista talvez exista — mas só influencia o tabuleiro se entrar no jogo. Fora dele, é hipótese.
A multiplicidade de nomes competitivos — incluindo figuras tradicionais como Ivo Cassol (PP), inelegível, e Confúcio Moura (MDB), que também aparecem em pesquisas em faixas entre 12% e 17% — reforça a tese inicial: com tantos candidatos dividindo o eleitor conservador, a esquerda, mesmo diminuída, terá papel definitivo. É a minoria que entrega ou retira o troféu.
E assim o enredo se fecha: o rondoniense de esquerda virou árbitro. Não vence a competição, mas entrega o troféu. É minoria decisiva. Quem quiser governar Rondônia não deve buscar apenas polarização, fidelidade bolsonarista ou carisma municipal. Deve buscar sobretudo entendimento. O eleitor progressista, que já foi grande e hoje é menor, guarda nas mãos a última palavra. Em 2026, vencerá não quem gritar mais, mas quem conversar melhor. Não quem brigar por bandeira, mas quem oferecer ponto de equilíbrio. O santo graal está aí.
Ganha o governo quem descobrir isso antes do segundo turno. Não depois.



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