Publicada em 27/11/2025 às 16h00
PORTO VELHO (RO) - A 1ª Turma Recursal do Tribunal de Justiça de Rondônia, com sede em Porto Velho, negou provimento ao recurso inominado interposto pelo Estado de Rondônia e manteve integralmente sentença que condenou o ente público ao pagamento de ajuda de custo a uma magistrada removida da Comarca de Buritis para a Comarca de Ariquemes. O julgamento ocorreu em 18 de novembro de 2025, sob relatoria do magistrado João Luiz Rolim Sampaio, do Gabinete 03, no Recurso Inominado Cível nº 7005628-79.2025.8.22.0002.
A ação originária foi proposta pela magistrada contra o Estado de Rondônia, com o objetivo de receber a verba indenizatória denominada ajuda de custo, prevista no artigo 65, inciso I, da Lei Complementar nº 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN), em razão da remoção com alteração de sede funcional, da Comarca de Buritis para a Comarca de Ariquemes. A remoção foi deferida a pedido, e a autora alegou ter arcado com despesas de mudança e instalação decorrentes do deslocamento e da assunção das funções na nova unidade jurisdicional.
Na contestação, o Estado de Rondônia sustentou que a LOMAN não seria aplicável de forma direta e imediata ao caso concreto e defendeu a prevalência da legislação estadual. O ente público invocou o artigo 55, parágrafo único, da Lei Complementar estadual nº 94/1993, segundo o qual não é devida ajuda de custo nos casos de remoção a pedido, afirmando tratar-se de hipótese em que o ato teria natureza discricionária da Administração, sem obrigação de indenizar as despesas decorrentes da mudança.
O juízo de primeiro grau, ao apreciar o pedido, julgou a ação procedente. Com base no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, a magistrada de origem entendeu que a matéria discutida era unicamente de direito e que os elementos existentes no processo eram suficientes para o julgamento antecipado. Na sentença, reconheceu-se que o artigo 65, inciso I, da LOMAN assegura ajuda de custo a magistrados que sofrem alteração de sede funcional com mudança de domicílio, como verba destinada às despesas de transporte e mudança, e que esse direito não depende da natureza da remoção ser de ofício ou a pedido.
Ao analisar o recurso do Estado, a 1ª Turma Recursal confirmou a sentença por seus próprios fundamentos, na forma do artigo 46 da Lei nº 9.099/1995, transcrevendo o teor da decisão de origem e acrescentando fundamentos de natureza administrativa e jurisprudencial. No voto, o relator destacou que a LOMAN é norma de observância obrigatória por todos os tribunais do país e que a expressão “poderão ser outorgadas aos magistrados” constante do artigo 65, inciso I, não confere discricionariedade absoluta ao ente pagador, devendo a concessão observar a ocorrência dos pressupostos fáticos de mudança de sede e existência de custos efetivos para o magistrado.
O colegiado registrou que, no caso concreto, não houve controvérsia sobre a remoção da autora por antiguidade para a Comarca de Ariquemes e sobre o fato de ela ter arcado com despesas de mudança e instalação. Concluiu que tais gastos decorrem diretamente do ato de provimento da unidade jurisdicional de destino e que a nomeação para o novo juízo implicou preenchimento de vaga declarada como necessária ao regular funcionamento da unidade, evidenciando o interesse institucional. Nesse contexto, a remoção foi qualificada como ato administrativo que atende simultaneamente ao interesse da magistrada e à necessidade do serviço público, com “manifesta convergência entre os interesses da autora e os da Administração”.
No voto, foram citados precedentes do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho Nacional de Justiça. A Turma Recursal transcreveu trecho de decisão do STJ no AgRg no REsp nº 1.472.062/RS, no qual se afirma que “a jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que o Magistrado faz jus à ajuda de custo, seja na remoção ex officio, seja na levada a efeito a pedido do interessado, uma vez que em ambas está presente o interesse público”. Também foi mencionada consulta ao CNJ (Consulta nº 0005369-14.2014.2.00.0000), na qual se assentou que “não há remoção do magistrado que não seja no interesse da Administração, uma vez que o preenchimento de cargo vago de magistrado sempre se faz no interesse do serviço público, já que é inerente à Administração da Justiça a ocupação de seus cargos”.
O voto ainda registrou que a decisão do CNJ foi apontada como marco para o Judiciário e para o Ministério Público ao reafirmar a simetria entre as carreiras, especialmente após a edição da Resolução nº 133/2011, que reconheceu a necessidade de compatibilizar a LOMAN com a Constituição Federal e equiparar vantagens funcionais entre magistrados e membros do Ministério Público. Nesse sentido, foram mencionadas normas da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei nº 8.625/1993) e leis orgânicas estaduais do Ministério Público de São Paulo e de Minas Gerais, todas prevendo ajuda de custo para remoção, com ressalva apenas para hipóteses de permuta.
Ao enfrentar a alegação de que o artigo 55, parágrafo único, da Lei Complementar estadual nº 94/1993 afastaria a ajuda de custo nas remoções a pedido, a Turma Recursal entendeu que tal dispositivo deve ser interpretado em conformidade com a LOMAN, a fim de preservar a natureza indenizatória da verba e garantir uniformidade de tratamento entre magistrados submetidos às mesmas condições de remoção. De acordo com o voto, a distinção entre remoção de ofício e remoção a pedido “não se sustenta” para efeito de exclusão da ajuda de custo quando configurado o interesse público, sob pena de esvaziar a finalidade do artigo 65, inciso I, da LOMAN e violar o princípio da isonomia.
O relator também ressaltou que, no sistema processual civil, o magistrado não está obrigado a rebater individualmente todas as alegações das partes, desde que apresente fundamento suficiente para a solução do litígio. Para tanto, citou entendimento do Superior Tribunal de Justiça segundo o qual “o juiz não está obrigado a responder todas as alegações das partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para fundamentar a decisão, nem se obriga a ater-se aos fundamentos indicados por elas e tampouco a responder um a um todos os seus argumentos”.
Mantida a sentença, foi confirmada a condenação do Estado de Rondônia ao pagamento da ajuda de custo correspondente a um mês de remuneração da autora na data da remoção, com atualização monetária e juros de mora conforme os critérios definidos pela Emenda Constitucional nº 103/2019, mediante aplicação da taxa Selic acumulada (correção e juros unificados) desde a data do requerimento administrativo. A 1ª Turma Recursal também fixou honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação, em favor da parte recorrida, e consignou que não há custas processuais em razão de se tratar de Fazenda Pública.
Na ementa do acórdão, o colegiado sintetizou a tese adotada ao afirmar que, em ações de natureza administrativa que discutem ajuda de custo a magistrados, “a ajuda de custo prevista no art. 65, I, da LOMAN é devida ao magistrado removido a pedido, quando demonstrado o interesse público na movimentação, o qual se presume pela abertura do concurso de remoção e pela efetiva necessidade de provimento da unidade jurisdicional de destino”. O acórdão registra que o recurso foi “conhecido e desprovido”, por unanimidade, nos termos do voto do relator.



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