Publicada em 18/11/2025 às 10h35
PORTO VELHO (RO) - A 4ª Vara Criminal de Porto Velho absolveu, na última segunda-feira, 17, os réus Francisco de Assis Moreira de Oliveira, Wagner Luis de Souza e Hernandes Sales Guerra das acusações de corrupção passiva e ativa relacionadas a fatos investigados no âmbito da Operação Armagedom, desdobramento da Operação Platéias. A decisão foi proferida pelo juiz Fabiano Pegoraro Franco, nos autos nº 7041999-84.2021.8.22.0001, após constatar que a instrução processual não comprovou os delitos narrados na denúncia oferecida pelo Ministério Público do Estado de Rondônia.
Cabe recurso.
O processo teve início com denúncia imputando aos acusados a prática dos crimes previstos nos artigos 317 e 333 do Código Penal, relacionados ao suposto pagamento de vantagens indevidas pela empresa RECOL Distribuição e Comércio Ltda. para obtenção de benefícios em contratos da Secretaria Estadual de Saúde (SESAU). A ação também envolvia o ex-governador Confúcio Aires Moura, cuja punibilidade foi extinta no curso do processo em razão de prescrição, conforme sentença anterior constante no ID 102518314.
A denúncia relatava dois fatos principais: o primeiro, referente à suposta solicitação, promessa e recebimento de propina entre o final de outubro e início de novembro de 2011, envolvendo Francisco de Assis, Wagner Luis e Hernandes Sales; o segundo, relacionado ao oferecimento de vantagens por parte de Roberto Alves Moura — proprietário da RECOL —, com o auxílio de Hernandes, para influenciar atos de agentes públicos na gestão de contratos da SESAU. O Ministério Público sustentou que haveria um percentual de 10% sobre o valor das contratações, vinculado ao processo administrativo nº 01-1712.01451-00/2011.
Os réus foram citados e apresentaram respostas à acusação. Francisco de Assis não compareceu à audiência de 1º de abril de 2025 e teve decretada sua revelia. No curso da instrução, foram colhidos depoimentos de testemunhas de acusação e defesa. O Ministério Público reiterou o pedido de condenação nos moldes da denúncia, enquanto as defesas requereram a absolvição, arguindo ausência de provas, inépcia da denúncia, cerceamento de defesa e inexistência de vínculo funcional ou de atos de ofício relacionados aos acusados.
Na fase de análise das preliminares, o juízo rejeitou novamente as alegações de incompetência, cerceamento de defesa, ilícitos na juntada de documentos e bis in idem, reiterando decisões anteriores registradas nos IDs 102518314 e 122810416. As questões foram consideradas superadas ao longo do processo.
Ao examinar o mérito, o juízo contextualizou que a ação penal se originou da Operação Armagedom, que investigou um conjunto de 23 fatos relacionados a corrupção, fraude a licitações e lavagem de dinheiro no âmbito do Governo de Rondônia durante a gestão de 2011 a 2018. O fato objeto destes autos refere-se ao suposto pagamento de propina ligado à contratação de medicamentos junto à empresa RECOL.
A materialidade administrativa — existência do contrato e do processo administrativo — foi reconhecida como comprovada. No entanto, a materialidade penal exigia demonstração de solicitação, recebimento, oferta ou promessa de vantagem ilícita, o que não foi confirmado durante a instrução.
O juiz destacou que os principais elementos da acusação se apoiavam nas declarações do delator/colaborador José Batista da Silva e do ex-servidor José Milton de Souza Brilhante.
Contudo, em juízo, ambos apresentaram limitações: José Milton informou que soube dos fatos apenas por relato de Batista enquanto estavam presos, não tendo presenciado pagamentos; José Batista confirmou ter recebido pedidos de Assis, mas afirmou não saber se houve entrega efetiva dos valores e, questionado diretamente pela defesa, declarou que Hernandes Sales não lhe ofereceu propina, eliminando um dos verbos nucleares da corrupção ativa.
Além disso, testemunhas negaram ter conhecimento de exigências ou pagamentos de propina. Testemunhas de defesa também relataram que atrasos nos pagamentos por parte do Estado eram comuns, o que contraria a tese de que haveria celeridade em troca de vantagens.
O réu Hernandes Sales afirmou, em interrogatório, que os pagamentos referentes ao contrato de R$ 1.930.472,30 ocorreram 55 dias após a entrega, prazo superior aos 30 dias legais, reforçando a inexistência de benefício indevido. Também declarou que não tinha autonomia financeira na empresa para firmar acordos desse tipo.
Documentos apresentados, como o Relatório de Análise Bancária e Fiscal nº 021/2024, não identificaram qualquer movimentação financeira entre os investigados. A denúncia mencionava doações eleitorais de 2010, mas elas foram feitas por empresa diversa do mesmo grupo e não tiveram relação comprovada com os fatos investigados de 2011.
Ao final, o magistrado concluiu que o conjunto probatório judicial foi frágil, insuficiente para comprovar materialidade e autoria, e que não houve corroboração externa das declarações feitas na fase inquisitorial. O juiz mencionou o art. 4º, §16, da Lei 12.850/2013, segundo o qual declarações de colaboradores não podem fundamentar condenação isoladamente, bem como o entendimento jurisprudencial sobre depoimentos de “ouvir dizer”.
Com base nisso, aplicou o princípio in dubio pro reo e absolveu os acusados com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, por ausência de provas suficientes para a condenação.
A sentença determina a comunicação aos órgãos competentes e o arquivamento dos autos após o trânsito em julgado.



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