Publicada em 02/10/2025 às 14h57
Porto Velho, RO – Porto Velho chegou ao seu 111º aniversário nesta quinta-feira com o abraço quente do rio Madeira e a lembrança dos trilhos que a construíram. A cidade, cuja fundação oficial data de 2 de outubro de 1914, ganhou forma e população a partir da construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré — cujos engenheiros, operários e migrantes ergueram esta terra e também moldaram suas ruas, bairros e vocabulários. Com o tempo, Porto Velho se fez com fé, canteiros industriais, invasões verdes e uma miscigenação cultural que atravessou gerações.
O nome “Porto Velho” emerge de narrativas locais: pode ter vindo de “Porto do Velho” ou “Ponto Velho”, referindo-se ao abrigo ribeirinho usado por barqueiros, lenhadores e operários do começo da ferrovia. À beira do Madeira, aquele ponto de parada e carga tornou-se o embrião da cidade. Antes de 1914, já havia ali um acampamento de serviços da construtora americana que trabalhava na ferrovia; esses homens, muitos estrangeiros, traziam técnicas, línguas, culturas que se misturaram ao solo amazônico. Com o tempo, Porto Velho deixou de ser um canteiro para se tornar cidade, capital territorial e, depois, estadual.
Esse passado reverbera na paisagem urbana. As Três Caixas d’Água — conhecidas como as “Três Marias” — foram importadas dos Estados Unidos, montadas peça por peça entre 1910 e 1912 e usadas por décadas no abastecimento. Hoje tombadas, simbolizam memórias de uma época em que até a estrutura mais utilitária tinha valor de marco. A Catedral do Sagrado Coração de Jesus, cuja pedra fundamental foi lançada em 1917 e cuja construção interna seguiu estilo gótico, acolhe cultos, silencios e visitantes em seu entorno central. O bairro Caiari — um dos mais antigos, que ocupou local onde se pretendia alojar diretores e engenheiros da ferrovia — preserva traços urbanísticos daquele tempo. Outras ruas e praças guardam armazéns e galpões que um dia foram palco da movimentação da Madeira-Mamoré.
Porto Velho também surgiu em ciclos econômicos. O auge da borracha, da mineração de cassiterita nos anos 1950, das expedições auríferas no leito do rio, das investidas agropecuárias — cada um desses momentos deslocou fluxos de migração, distribuição espacial e tessitura social. Reza uma cartilha local que muitos migrantes nordestinos, os chamados “soldados da borracha”, fizeram da cidade seu refúgio e plantaram raízes que permanecem nas conversas, ritmos e sotaques. Quando a ferrovia deixou de operar plenamente, em 1972, Porto Velho se reinventou, adaptando suas ruas, memórias e ocupações ao presente.
Na contemporaneidade, Porto Velho é a capital de Rondônia, com território amplo, situado na margem leste do Madeira, cidade fronteiriça com a Bolívia, parte da rica Amazônia ocidental. É uma das capitais mais jovens do Brasil, mas também uma das que mais contam lutas por infraestrutura, mobilidade urbana e saneamento. Ao caminhar por seu centro, é possível cruzar praças onde grafites recentes dialogam com suportes metálicos da era ferroviária, escutar ritmos regionais em bares, ver tambores em praças públicas e sentir o frescor do rio ao entardecer. Os circuitos de turismo valorizam o Complexo Madeira-Mamoré, com trilhos restaurados e museu, o Mercado Cultural, o Parque Natural Raimundo Paraguassu, e as margens do rio, onde o pôr do sol é programa quase ritual para moradores e visitantes.
Há ainda o Porto de Porto Velho, que opera como porto fluvial, conectado por terminais RO-RO (Roll-on/Roll-off) e rampas para embarcações, com capacidade para movimentar cargas agrícolas e graneleiras rumo ao Arco Norte. A ferrovia original deixou de ser o eixo de transporte — mas muitos dos galpões e estruturas de apoio que sobreviveram foram reaproveitados como memória viva ou espaço cultural. Nas conversas de moradores mais velhos, fala-se de “quando o trem passava”, “quando o porto era rampa viva”, “quando o rio tinha outro contorno”. Esses fragmentos pessoais constroem o mosaico da cidade.
Embora não se possa dizer que tudo é festa na cidade — há desafios evidentes em saúde pública, mobilidade, moradia e saneamento — Porto Velho se apresenta hoje como um encontro de memórias vivas e transformações constantes. A beleza não está apenas nos cartões-postais, mas também nos olhos das pessoas que caminham pela orla, nas barquinhas que sobem e descem o Madeira, nos abacaxis vendidos nas calçadas, nas rodas de capoeira nos bairros, nas rodas de conversa em praças — tudo pulsando no compasso amazônico.
As festividades do aniversário operam como condensado desse pulsar. A programação começou na quarta-feira (1º) com show gospel gratuito da dupla Jefferson & Suellen no Complexo da Madeira, reunindo famílias, comunidades cristãs e admiradores da música evangélica; locais como José Roberto, Vitória & Rebeca, Ministério Cristo Servo e Banda EA Sounds também subiram ao palco naquela noite. O prefeito Léo Moraes definiu o momento como “emocionante, um momento de comunhão”. Hoje, quinta-feira, 2, a festa segue com apresentação especial de Joelma, com entrada aberta ao público. Essa celebração musical integra uma série de cinco dias de shows, cultura, esporte, exposições e lazer, com programação diária (a partir das 18h) e participação de artistas regionais como Marla Souza, Gata Forrozeira, Lene Ventura e DJ Lacaia.



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