Publicada em 09/12/2025 às 16h27
PORTO VELHO (RO) - O Tribunal de Contas do Estado de Rondônia (TCE-RO) determinou a suspensão imediata do Pregão Eletrônico nº 135/2025/SRP, da Prefeitura de Chupinguaia, que previa a formação de registro de preços para futura contratação de empresa especializada no fornecimento e locação de máquinas, veículos e equipamentos pesados. O valor estimado do certame chega a R$ 7.383.264,00, com contratação prevista pelo regime de hora/máquina para atender demandas da Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos (SEMOSP) e da Secretaria de Administração (SEMAD).
A decisão, de natureza monocrática, foi proferida pelo conselheiro Francisco Carvalho da Silva no âmbito do Processo nº 04302/25, em representação formulada pelo Ministério Público de Contas do Estado de Rondônia (MPC/RO). O órgão ministerial apontou a existência de ilegalidades consideradas graves no edital e nos estudos que fundamentam a licitação, pedindo a concessão de tutela inibitória para impedir a realização da sessão de abertura marcada para 10 de dezembro de 2025, às 9h (horário de Brasília).
O jurisdicionado é o Poder Executivo do Município de Chupinguaia. Foram apontados como responsáveis o prefeito Wesley Wanderley da Costa Gonçalves, o secretário municipal de Obras e Serviços Públicos, Jeferson Barbosa França, e o secretário municipal de Administração, Jadson Paulino de Abreu. A decisão registra que o processo foi distribuído em 5 de dezembro de 2025 e recebido no gabinete do relator ainda na manhã do mesmo dia, antes da data prevista para o pregão.
Na representação inicial, o Ministério Público de Contas afirma que o edital revela vícios capazes de comprometer a legalidade e a competitividade do procedimento licitatório, com “risco concreto à integridade da despesa pública e à competitividade do certame”. Entre os pontos questionados, o MPC elenca, em síntese: falha na justificativa da necessidade da contratação; ausência de justificativa técnica para os quantitativos licitados; pesquisa de preços considerada irregular e limitada; risco de sobrepreço; fragilidades nos requisitos de qualificação econômico-financeira; ausência de critérios objetivos na qualificação técnica por atestados; e incongruências entre a vigência contratual e o prazo para execução dos serviços.
Um dos eixos centrais da representação está na justificativa da opção pela locação de máquinas pesadas, por horas de serviço, em prazo contratual estimado em apenas três meses. Segundo o MPC, o Termo de Referência descreve equipamentos de uso habitual na rotina da Secretaria de Obras, como caminhão basculante, escavadeira hidráulica, motoniveladora e pá carregadeira, o que, em tese, não se compatibilizaria com uma necessidade transitória ou emergencial típica de um modelo excepcional de contratação por locação temporária. O órgão ministerial observa que a justificativa apresentada é genérica, não demonstra inviabilidade de execução com recursos próprios e não comprova incapacidade técnica para execução direta, embora a SEMOSP conte com 40 servidores lotados, incluindo operadores de máquinas.
A decisão destaca ainda que o Termo de Referência prevê execução contratual em três meses, com início em período de chuvas intensas na região, o que também é mencionado pelo MPC como fator a ser considerado na análise da viabilidade. Outro ponto levantado é a ausência, na justificativa, de estudos comparativos que demonstrem a vantagem econômica da locação frente à eventual aquisição dos equipamentos. De acordo com a peça ministerial citada na decisão, o valor global pretendido para três meses de locação (R$ 7.383.264,00) seria suficiente para permitir à Administração adquirir uma unidade de cada item licitado, tomando como referência tabela de equipamentos publicada pelo DER de São Paulo, estimada em R$ 4.825.154,99. Esse contraste é apontado como indicativo preliminar de inviabilidade econômica do modelo proposto, à luz do artigo 5º combinado com o artigo 18 da Lei Federal nº 14.133/2021.
Outro ponto de destaque é a estimativa dos quantitativos licitados. O Ministério Público de Contas identificou que o Estudo Técnico Preliminar e o Termo de Referência projetam um total de 20.280 horas de serviço a serem contratadas em apenas três meses, com jornada de 10 horas diárias, sem pausas, o que, na prática, representaria mais de 225 horas-máquina por dia. Segundo a representação, não foram apresentados estudos ou memórias de cálculo que detalhem onde esses serviços seriam realizados, como linhas vicinais, ruas ou logradouros específicos, nem a extensão em quilômetros das vias a serem recuperadas, embora a legislação exija estimativas quantitativas fundamentadas e acompanhadas de documentação de suporte.
Em relação à pesquisa de preços, o MPC aponta que a Administração se valeu basicamente do sistema Banco de Preços e de licitações realizadas nos anos de 2019, 2020, 2021 e 2022, o que, segundo a representação, não atende às exigências atuais da Lei nº 14.133/2021. A norma determina que sejam consideradas contratações similares em execução ou concluídas no período de até um ano anterior à pesquisa, além de outras fontes, como mídia especializada, tabelas referenciais e orçamentos junto a fornecedores. A decisão menciona que, conforme descrito pelo órgão ministerial, não houve pesquisa direta com pelo menos dois ou três fornecedores dentro do prazo de seis meses anteriores à publicação do edital, nem utilização de dados de tabelas oficiais, o que caracteriza, em tese, violação aos dispositivos legais que tratam da formação do orçamento estimado.
A partir dessa base, o Ministério Público de Contas calculou um risco de sobrepreço a partir da comparação entre os valores orçados e as tabelas referenciais do DER de Rondônia e do DER de São Paulo. No caso da escavadeira hidráulica (item 2.3 do Termo de Referência), considerando 1.800 horas estimadas, o risco de sobrepreço foi apontado em R$ 198.630,00. Para a motoniveladora (item 2.4), com 3.600 horas, o valor identificado chega a R$ 896.184,00. No item referente à pá carregadeira (2.5), com 2.700 horas, a representação indica risco de R$ 481.761,00. Já no rolo compressor pé de carneiro (2.6), com 900 horas, o risco estimado é de R$ 165.141,00. Por fim, no item 2.7, relativo ao trator agrícola com roçadeira hidráulica articulada, para 480 horas, o risco de sobrepreço calculado é de R$ 9.931,20.
Somados esses itens, o Ministério Público de Contas aponta um risco total de sobrepreço de R$ 1.751.647,20 no certame, o que, conforme reproduzido na decisão, afrontaria o princípio da economicidade e o interesse público previstos na Lei nº 14.133/2021. O relator relembra precedente do próprio TCE-RO, segundo o qual, em contratações de hora-máquina e obras de engenharia, “nenhum sobrepreço unitário é aceitável, ainda que a planilha orçamentária apresente preço global inferior aos referenciais adotados”.
No campo da habilitação dos licitantes, a decisão reproduz a crítica do MPC à exigência de qualificação econômico-financeira prevista no edital. O item 12.5.a do instrumento convocatório exige apenas certidão negativa de recuperação judicial, em conformidade com o artigo 69, II, da Lei 14.133/2021, mas não prevê, segundo a inicial, a apresentação de balanço patrimonial, demonstração de resultado de exercício e demais demonstrações contábeis dos dois últimos exercícios sociais, que são facultadas pela legislação no artigo 69, I. Para o órgão ministerial, considerando que o objeto envolve serviços que demandam estrutura robusta e maquinário pesado, seria proporcional exigir esse conjunto de demonstrações contábeis, de forma semelhante ao praticado em outros municípios em licitações do mesmo tipo.
Também foram apontadas falhas na definição de critérios objetivos para avaliação da qualificação técnica mediante atestados. O edital e o Termo de Referência exigem comprovação de execução prévia de serviços de locação de máquinas, veículos e equipamentos pesados, porém, segundo o MPC, não delimitam qual parcela do objeto deve ser considerada de maior relevância ou valor significativo, nem estabelecem percentuais mínimos de execução a serem comprovados. A Lei nº 14.133/2021 prevê que a exigência de atestados deve se restringir às parcelas de maior relevância, entendidas como aquelas cujo valor individual seja igual ou superior a 4% do valor total estimado da contratação, e autoriza a fixação de balizas objetivas para essa comprovação. A ausência dessas balizas é apontada como fator que fragiliza a aferição da capacidade técnica das empresas interessadas.
Outro ponto destacado na decisão diz respeito à incongruência entre a vigência contratual e o prazo de execução dos serviços. Conforme descrito no processo, a Administração estimou quantitativos e preços para um período de três meses de execução, mas o item 2.3 do Edital e a cláusula quinta da minuta de contrato não definem prazo objetivo de vigência, condicionando-o a necessidades da área demandante. Ao mesmo tempo, o Termo de Referência indica vigência de seis meses em um dispositivo (item 6.2) e prazo de execução de três meses em outro (item 6.3). Para o MPC, essa redação é subjetiva e pode afetar a competitividade ao não permitir que as empresas dimensionem adequadamente custos, equipe e disponibilidade de maquinário, o que, em tese, contraria o artigo 84 da Lei 14.133/2021.
Diante do conjunto das irregularidades apontadas na representação, o conselheiro relator conclui que estão presentes os requisitos para concessão de tutela antecipatória, previstos no artigo 108-A do Regimento Interno do TCE-RO. O fumus boni juris, segundo a decisão, decorre dos indícios de falhas graves na fase de planejamento e na modelagem do certame, capazes de comprometer a legalidade do instrumento convocatório. Já o periculum in mora é identificado no fato de que a sessão de abertura da licitação estava marcada para ocorrer em 10 de dezembro de 2025, o que poderia levar à conclusão do certame sem a correção das falhas descritas, tornando ineficaz uma eventual decisão final de mérito.
Na parte dispositiva, o conselheiro Francisco Carvalho da Silva defere o pedido de tutela antecipatória formulado pelo Ministério Público de Contas e determina ao prefeito Wesley Wanderley da Costa Gonçalves, ao secretário municipal de Obras e Serviços Públicos, Jeferson Barbosa França, e ao secretário municipal de Administração, Jadson Paulino de Abreu, ou a quem os substitua, que promovam a imediata suspensão do Pregão Eletrônico nº 135/2025/SRP, no estado em que se encontra. A decisão estabelece prazo de cinco dias, a contar da notificação, para que os responsáveis comprovem perante o TCE-RO o cumprimento da ordem de suspensão, sob pena de multa coercitiva e de aplicação da sanção prevista no artigo 55, IV, da Lei Complementar nº 154/96, sem prejuízo de outras medidas legais.
O relator também determina que, tão logo sejam encaminhados os documentos que comprovem a suspensão do certame, os autos sejam remetidos ao corpo técnico do Tribunal para análise preliminar mais aprofundada, com possibilidade de diligências complementares. Caso o prazo se esgote sem comprovação de cumprimento da decisão, o processo deve retornar diretamente ao gabinete do conselheiro para adoção das providências cabíveis.
A decisão, assinada eletronicamente em 8 de dezembro de 2025, é classificada no sistema do Tribunal de Contas como “não julgado”, o que indica que o mérito da representação ainda será apreciado pelo colegiado após a instrução técnica. Até lá, o Pregão Eletrônico nº 135/2025, destinado à contratação de locação de máquinas pesadas por hora para o município de Chupinguaia, permanece suspenso por ordem cautelar do TCE-RO.



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