Por Rondoniadinamica
Publicada em 29/01/2020 às 08h41
Enchente histórica de 2014 guarda relação com ambos os casos / Foto: Daniane Mendonça (Decom-RO)
Porto Velho, RO — Em dois autos distintos, a juíza de Direito Úrsula Gonçalves Theodoro de Faria Souza, representando a 8ª Vara Cível de Porto Velho, condenou a Santo Antônio Energia S. A., responsável pela hidrelétrica homônima no Rio Madeira, ao pagamento total de R$ 80 mil em indenização por danos morais ambientais individuais.
Na primeira sentença, a ação foi movida por Oziel Nogueira de Souza, sozinho, enquanto na outra participam do pleito jurídico três pessoas. São elas: Luiz Pereira da Silva e Souza, Miliane Nascimento da Silva e Heloisa da Silva e Souza.
Cabem recursos em ambas as decisões. O jornal Rondônia Dinâmica veicula ao fim da reportagem as íntegras documentais das compreensões do Juízo.
Entenda
01) O caso de Oziel, autos n º 7007500-16.2017.8.22.0001
Ele alegou que no ano de 2014, nos meses de fevereiro, março, abril e maio, o Rio Madeira teve o nível de suas águas à jusante da UHE Santo Antônio, tragicamente elevadas, por ações e omissões que imputam à empresa responsável.
Oziel afirmou ser morador da Comunidade São Miguel.
Verberou tamb ém que diante da grande alagação ocorrida sofreu patrimonial e moralmente com o evento, vez que não houve a devida aplicação de forma adequada dos estudos de impactos ambientais realizados, nem mesmo diante do Plano Básico Ambiental – PBA, já que houve um excesso de deposição de sedimentos dentro do Rio Madeira, com maior quantidade na parte montante de sua barragem, em seu reservatório.
Disse ainda que a Santo Antônio Energisa (SAE) não teria observado as condicionantes, para controle da vazão no período de cheia, impostas pela Agência Nacional de Aguas – ANA.
Destacou Oziel que a SAE construiu a UHE Santo Antônio no Rio Madeira, obstruindo o curso regular do rio, alterando todo o comportamento dos ribeirinhos e moradores da cidade de Porto Velho, pois as obras modificaram o nível das águas do Rio Madeira, ao qual, com as chuvas que são tropicais nesta região, bem como as aberturas de comportas, provocam constante elevação no nível das águas e alteração de pressão e vazão de águas, além da modificação da calha natural do rio.
Sustentou por fim ter sofrido danos irreparáveis com a inundação artificial, e grande deposição de sedimentos, que atingiu a comunidade em que vive, que teria amargado a perda de seus bens móveis, do imóvel em que residia, das culturas plantadas, bem como de sua renda.
Alegou, então, que a SAE fora negligente e omissa na realização dos estudos e teria subdimensionado os impactos ambientais em seu EIA/RIMA [Estudo e Relatório de Impacto Ambiental].
Considerações da juíza:
"Atropelo político"
Em determinado trecho da sentença, Úrsula Gonçalves pontuou:
" salta à cognição o fato de ter havido um verdadeiro atropelo político das questões técnicas essenciais à proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, para a aprovação do empreendimento exploratório, que denota o fim precípuo do anseio da sociedade de risco contemporânea... [...]".
E complementou:
"[...] a expansão econômica para obtenção de lucros cada vez maiores, ignorando as consequências lesivas m sua amplitude concreta, ou ocultando-as propositadamente [...]", anotou.
02) O caso do trio Luiz, Miliane e Heloisa, autos nº 7045403-22.2016.8.22.0001
O trio alegou residir às margens do Rio Madeira, no Distrito de São Carlos, e que a região fora sendo afetada "a longa data pelo empreendimento da UHE Santo Antônio".
Narraram que de fevereiro a julho de 2014 diversas famílias do referido distrito tiverem que abandonar seus lares em razão da cheia que ocorrera, "sustentando que esse distrito teria sido a localidade que mais teria sofrido com a cheia, pois teria sido submergida, e aduzem que este quadro poderia ter sido evitado, caso a requerida tivesse tomado precauções cabíveis".
Contaram ainda que uma parcela dos moradores da comunidade fora socorrida pela Defesa Civil, por dragueiros e barqueiros, e transportados até Porto Velho, vindo a serem alojados no Parque dos Tanques em barracas improvisadas.
"E, que a ré [SAE] nada teria feito para amenizar as perdas dos moradores de São Carlos. Sustentaram a perda de anos de trabalho, a destruição de sonhos, abalos e transtornos emocionais, com a perda de suas plantações, arvores frutíferas, contaminação da água potável e destruição das casas por sedimentos".
Por fim, arguiram haver falhas no EIA/RIMA, e que o Distrito de São Carlos não fora contemplado nos estudos ambientais, bem como que viveriam atemorizados pelo receio na recorrência de uma enchente nos níveis da que ocorrera em 2014.
Considerações da juíza:
"Pelo escorço probatório coligido aos autos, os documentos públicos disponíveis, e que guarnecem relação com o empreendimento erigido na seção do rio onde outrora existia a Cachoeira de Santo Antônio, depreende-se que a grande vazão afluente – que teve como consequência a histórica precipitação pluviométrica – teve sua força de arraste potencializada com a concentração da vazão por via dos canais de fuga e restituição do barramento da requerida [SAE]", sacramentou.
A magistrada continuou o raciocínio:
"À montante havia a redução da velocidade do rio provocando a deposição dos sedimentos mais densos no reservatório como consequência natural, prevista no projeto, e inclusive guarnece relação direta com a vida útil do potencial do empreendimento, uma vez que reduz a capacidade do reservatório (causando também um impacto de ampliação na área de remanso)".
Em seguida, asseverou :
"Diante do volume da vazão que afluiu, uma parcela dos sedimentos que teriam sido depostos à montante fora arrastada e somada ao volume de sedimentos carregados naturalmente pelo rio. Passando à jusante, a grande vazão encontrou um curso hidrológico que já se encontrava em desequilíbrio, em decorrência da modificação na conformação do relevo submerso, com a erosão grosseira logo após a barragem".
"[...] com os sedimentos adicionados ao álveo pela requerida com as dragagens que realizara, e que já haviam provocado o assoreamento de alguns pontos do rio, o desequilíbrio e intensificação dos desbarrancamentos e escorregamentos das margens que se depositam na calha, porquanto fora modificado o talvegue deste", concluiu.
SENTENÇAS:
OZIEL

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