
Publicada em 07/03/2025 às 09h30
Dentre as infinitas coisas que não existem em Porto Velho, capital de Roraima, uma das que mais chamam a atenção é a falta de um hospital de pronto-socorro para a sua população. Entra governo e sai governo e a “pior dentre as capitais do Brasil para se viver” continua com o seu sinistro destino: nunca teve um lugar decente para receber e tratar seus pacientes necessitados em estado de emergência. Na verdade, existe o João Paulo Segundo, um velho e carcomido “açougue” oriundo ainda dos tempos da construção da hidrelétrica de Samuel que faz as vezes de pronto-socorro e que funciona precariamente desde o início da década de 1980 como um hospital de urgência e emergência. O João Paulo Segundo resiste ao tempo e é uma espécie de campo de extermínio daqueles da Segunda Guerra Mundial. Só que não mata judeus, só os pobres.
O velho “açougue” porto-velhense tem sido durante todo esse tempo como uma verdadeira mina de ouro para a classe política e para as autoridades em geral do Estado. Já elegeu vereador, deputado estadual, deputado federal, senador e até governador. Não há um só político que não tenha prometido melhorar as instalações daquele campo de concentração durante as suas campanhas políticas e como sempre o povão, que dele necessita, acredita na lorota e enche os espertos de votos e mais votos. Construir um bom hospital de pronto-socorro para Porto Velho e destruir para sempre as precárias e imundas instalações do João Paulo pode secar a fonte e não eleger mais nenhum político. A mentira da vez foi a construção de um novo hospital de pronto-socorro com nome em inglês para fascinar e entusiasmar os seus paupérrimos usuários: era o “Built to Suit” na zona Leste.
E óbvio que muita gente sabia que um hospital assim jamais sairia do papel. E não saiu mesmo. Porto Velho não seria mais Porto Velho se tivesse um logradouro público de saúde até parecido com alguns hospitais do primeiro mundo. Rondônia, a província atrasada e esquecida do Brasil, até merecia, mas o destino traçado pela classe política do Estado não quis assim. Ninguém dá um pio hoje, mas no próximo ano aparecerão vários candidatos prometendo hospitais e mais hospitais públicos para a “capital das sentinelas avançadas”. Talvez agora com nome em francês ou alemão. Já pensou que chique você se internar no “Hôpital aux urgences”? Preocupado com as possíveis repercussões negativas do fracasso do “Built to Suit”, o atual governador de Rondônia já criou uma “comissão de sábios” para tentar estudar uma possível compra de um hospital particular.
E assim, de promessas vãs, caminham Porto Velho e Rondônia. Léo Moraes, o bem intencionado prefeito recém-eleito da capital, por exemplo, prometeu acabar com a eterna sujeira da cidade. Conseguiu um sucesso aqui outro ali, mas o problema principal ele ainda não atacou: a construção de redes de esgotos e de saneamento básico, assim como a oferta de água tratada para a população. A construção de um bom hospital de pronto-socorro levaria à falência as poucas clínicas particulares e os caríssimos planos de saúde e hospitais privados daqui. Nos últimos quarenta anos, Porto Velho viu florescer na cidade várias repartições públicas luxuosas, modernas e nababescas. Do CPA, aos Ministérios Públicos e fóruns é o que mais se vê. O próprio governo do Estado está construindo atualmente um “palácio” para a Polícia Civil na avenida Imigrantes. O difícil mesmo é construir um pronto-socorro para o povo, como se o “açougue” fosse uma grife.
*Foi Professor em Porto Velho.