Marcelo Rezende: morre o homem, fica o legado

Marcelo Rezende: morre o homem, fica o legado

Porto Velho, RO – Marcelo Luiz Rezende Fernandes, ou apenas Marcelo Rezende, como era e sempre será conhecido, morreu no último sábado (16) após falência múltipla de órgãos. O câncer no pâncreas – com metástase para o fígado – silenciou de vez uma das vozes mais marcantes da televisão brasileira. Ele tinha apenas 65 anos. Sim, apenas. 

Particularmente, Rezende atraiu minha atenção como comandante do memorável Linha Direta (1999/2000), trazendo casos de barbáries numa narrativa novelesca com direito a locuções dramáticas, recheadas de um suspense quase coercitivo tamanha sedução e demais atrativos teatrais, como a simulação dos relatos.

Eu, uma criança facilmente impressionável, não sabia exatamente se tinha medo daquele homem sério e de postura rígida a falar tão friamente sobre esquartejamentos, decapitações e outras atrocidades, mas, sabendo ou não, criou-se empatia, vínculo necessário que levava o menino a acompanhá-lo sempre que pudesse.


Entretanto, ainda que o Linha Direta soasse recreativamente chamativo, o melhor trabalho jornalístico de Marcelo Rezende, que ficará para sempre registrado em seu histórico, fora a investigação que levou ao desfecho do Caso Favela Naval, onde, em 1997, vários policiais militares foram flagrados humilhando, extorquindo, espancando e até mesmo executando moradores numa blitz em Diadema, São Paulo.   

Colega de redação de “monstros” como o destemido Tim Lopes, um dos vencedores do Prêmio Esso, assassinado enquanto cumpria pautas contra narcotraficantes, e ainda do anjo pornográfico Nelson Rodrigues, é fácil entender por que Marcelão exibia com facilidade facetas teatrólogas concomitantemente à coragem necessária ao jornalismo investigativo – que não é pra qualquer um, convenhamos!

Perdeu o prumo – e minha audiência – a meu ver, quando decidiu criar a caricatura boba de âncora policial humorístico já na Record. Porém, acabou contrariando minha opinião, e que bom para ele que tenha sido assim, fechando com maestria a carreira bem sucedida em quesitos como reconhecimento, dinheiro, apreço e audiência.

Trabalhando para um dos inúmeros estelionatários da fé, acabou destrinchando a vida financeira de outro do mesmo ramo, o pastor Valdemiro Santiago, da Mundial. Contrariado com a reportagem, o apóstolo revelou tê-lo amaldiçoado, exigindo que as mãos de Deus pesassem sobre sua vida.

Claro que Santiago não tem poder algum, a não ser um talento singular para tomar dinheiro de pessoas ingênuas e choramingar na televisão pedindo montanhas de grana. Só pensa nisso. Só vive disso. É um mau caráter cheio de influência – e só! Marcelo morreu porque tinha de ir, era o seu momento. Assim como chegará o nosso.  

Ao enfrentar a doença, demonstrou coerência. A doçura retratada pelo olhar frágil de um corpo completamente combalido, cheio de fé e esperançoso, ergueu a cabeça e exortou bravura até seus últimos momentos. Sucumbiu o ser humano, ficaram os ensinamentos.

Vá em paz!

Autor / Fonte: Vinicius Canova

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