© Foto: Alejandro Acosta/Reuters


O Ronaldinho por trás das câmeras, sem o grupo de guarda-costas que impedem todo contato com a imprensa e as multidões, surpreende a tudo e a todos.

"Vive recluso em sua casa, rodeado por familiares e amigos. Aí treina duro. Não pode sair para um restaurante; é impossível que o faça em Querétaro, pois estaria sobrecarregado pelas pessoas. A um café tampouco vai, nem passear por um centro comercial pode. Fica em casa", relata o preparador físico dos Gallos Blancos de Querétaro, o argentino Roberto Bassagaisteguy.

Em entrevista exclusiva para a ESPN do México, o treinador destrincha como é a vida do atacante brasileiro, criticado por ter aparecido muito tarde para a pré-temporada, motivo pelo qual ainda não estreou no Torneio Clausura 2015.

 

 

Trabalha diferente o físico

'Ronal' ou 'Dinho', como chamam seus parentes, alugou uma casa em um clube de golfe, no topo de uma colina no meio da cidade (Residencial El Campanario). "Ele pediu permissão ao dono para fazer uma quadrinha de futevôlei e fica três, quatro horas jogando todos os dias, depois de treinar com a equipe. Na verdade, o que poderia fazer comigo realiza em seu ambiente, como ele gosta, como é feliz".

Bassagaisteguy, que soma quase 30 anos trabalhando no México, o considera um jogador especial. "Vive com seus amigos, com seus familiares, com as pessoas com quem se dá bem; são necessidades do ser humano. Regularmente vêm ao México seus amigos do Brasil que são grandes esportistas também. Creio que lhe visita regularmente um que é campeão no Brasil de futevôlei, que tem um domínio de bola extraordinário. Com eles, ele joga e se diverte, assim como com a família".

"Ele os traz para não ficar com saudade da camisa do Brasil, para não ficar sozinho. Sua família lhe pergunta o que quer comer, e come a fabada (ensopado) e isso e aquilo. Preparam a comida que eles se acostumam. Então, não sente falta", declara o professor, que viveu na época dourada do Necaxa nos anos 1990.

Revela o integrante do corpo técnico do Gallos Blancos que Ronaldinho "não faz treino físico comigo, porque não posso colocá-lo para correr, pois ele não gosta. No entanto, fica no ginásio comigo, levanta peso, trabalhos com um grupo de jogadores especiais de velocidade, de piques, de saltos, mas tem coisas que ele não gosta. Pela minha experiência, eu sei o que ele não gosta, como não gosta Danilinho tampouco e como não posso fazer com um jogador como ‘Sinha', porque são futebolistas especiais".

 

 

Não fazê-lo sofrer

Tem claro que para os jogadores do tamanho de Ronaldinho (talentosos e que já superaram os 30 anos) se deve buscar o bem-estar no trabalho. "Não tenho que fazê-lo sofrer. Não me interessa fazer sofrer o jogador; não há razão para isso".

E completa: "Se perguntarmos a um preparador físico italiano, francês ou espanhol por que não trabalha tanto Ronaldinho fisicamente, vai alegar o mesmo: porque se deve dar a ele trabalho que lhe faça bem e que esse trabalho eleve seu rendimento físico. Por isso deixamos que tenha atividades (como o futevôlei) que faça com felicidade".

 

 

Não corre os 90 minutos

Bassagaisteguy assinala que no campo a estrela queretana "talvez já não corra os 90 minutos, mas 60; mas 60 de Ronaldinho são 180 de qualquer jovem que está começando, inclusive de alguns jogadores de nome. Ele já não percorre todo o campo como poderia fazer um jovem".

Pela condição atual do jogador, rechaça que fazendo trabalho diferenciado corra o risco de não alcançar uma boa forma física e não render para a equipe.

"Trabalhando assim também se pode conseguir a mesma condição física sem fazer sofrer, pois formas para tê-la têm muitíssimas", enfatiza. "Pergunte ao preparador físico do Barcelona se põe para correr Messi ou Iniesta ou Xavi ou os jogadores que tem. Para eles fazem jogos que sejam bons para sua condição e para que se apresentem. Eles tampouco gostam de sofrer nos treinamentos; eles mudaram muito, assim como mudaram muitas coisas no futebol, como os desenhos táticos nos últimos 15 anos".

 

 

Ambriz não o colocaria para marcar

Para Bassagaisteguy, não necessariamente um jogador talentoso de hoje deve aprender a marcar e a roubar bolas; considera que para fazer funções de sacrifício tem outra classe de pessoas. "Nacho Ambriz, que é um técnico muito capacitado, sabe que Ronaldinho não vai recuperar uma bola, mas que ele vai usá-la, isso vai. Ele sabe que Sinha se sacrifica demais e pode recuperar uma bola, mas uma; sabe que Danilinho é um tipo que se entrega totalmente e vai recuperar uma bola, mas não peça coisas a jogadores que não lhe dar".

 

 

 

 

 

 

Mimado pelo irmão

O preparador físico dos Gallos Blancos reafirma que a ex-estrela do Barcelona já não tem a vida de antes e que agora possui um bom comportamento, sem festas, sem saídas à noite.

"Está decidido a jogar. O que ele quer de sua vida é jogar futebol. Ele quer a bola. Chega um momento em que o jogador se cansa daquele tipo de vida; além disso, creio que ele é mimado pelo irmão (Roberto de Assis Moreira, também seu representante). É quem controla absolutamente tudo. ‘Tem que cobrar isso, tem que cobrar aquilo, tem que inverter isso'. É seu problema de toda a sua vida", afirma, certo de sua percepção.

Por outro lado, o professor assegurou que "é um jogador extremamente humilde pelo que já foi; mas todas as coisas que ele fez, seu comportamento em outros clubes, também tiveram Figo, Zidane, Maradona, Roberto Carlos. Os jogadores especiais têm esse desnível em sua vida, e por suas circunstâncias podem fazer absolutamente o que quiserem".

Por último, Roberto Bassagaisteguy assegurou: "Por que elegeu jogar no Querétaro, se tinha propostas de ir para MLS, Dubai, Arábia Saudita? Porque é uma cidade familiar para ele; fala-se o idioma que ele conhece, se encontra cômodo. Penso que Ronaldinho veio ao México para ser feliz na última etapa que lhe resta do futebol; por isso está dedicado a treinar, porque ama a bola".

 

* Matéria escrita por Graciela Reséndiz, do ESPNDeportes.com