Morre a atriz e cineasta Susana Moraes, filha do Poetinha



POR O GLOBO


Suzana Moraes em foto de 2008 - Marcos Ramos / Agência O Globo

 


RIO - A atriz e cineasta Susana Moraes, de 74 anos, morreu nesta terça-feira. Filha de Vinicius de Moraes, Susana sofria de câncer no endométrio. Ela se casou em 2010 com a cantora e colunista do GLOBO Adriana Calcanhotto, oficializando uma relação que durou 26 anos. O velório será nesta terca-feira, na Capela 3 do Cemitério São João Batista a partir das 21h, e a cerimônia de cremação se realizará na quarta (28 de janeiro), às 17h, no Memorial do Carmo, no Caju.



Susana estava internada na clínica São Vicente, na Zona Sul do Rio de Janeiro, desde o dia 5 de janeiro. Segundo o oncologista Bruno Nahoum, às 5h desta terça-feira, Susana foi vítima de infecção respiratória em decorrência do câncer.



Susana Moraes era cheia de histórias. Primeira filha de Vinicius de Moraes, chamou muito tempo o pai de “darling” — o que levou uma babá, quando a família morava em Los Angeles, a chamar o poetinha de “Seu Darling”. Depois achou que era um tratamento íntimo demais para ser usado em público. Aprendeu com o pai a amar o jazz e o cinema. Nadou na piscina de Carmen Miranda criança e, mais tarde, lembraria com fascínio do closet da diva.

 

 



Em busca da própria identidade, diante de um pai que virou um astro, Susana buscou a intensidade na vida: militou politicamente e aproveitou a liberação de costumes da contracultura. Por muito tempo, quando dava entrevistas, se recusava a falar sobre o pai — e só depois de “muita psicanálise e muito ácido lisérgico” deixou aquilo para trás. Via como se houvesse cumprido uma jornada do destino: afastou-se da sombra do poetinha em busca de si mesma, para depois voltar a ele, dessa vez cuidando da perpetuação da obra de Vinicius após sua morte como uma das primeiras administradoras de seu espólio.



Atriz e cineasta, Susana era casada e colunista do GLOBO Adriana Calcanhotto, que esteve a seu lado na luta contra um câncer no endométrio. “Fui a mulher mais feliz do mundo nestes 26 anos em que estive com ela. Uma grande mulher, inteligente, engraçada, culta, amiga dos amigos, que teve uma vida extraordinária, e que viveu cada segundo como nunca mais. Morreu de mãos dadas comigo. Foi-se o amor da minha vida”, afirmou a artista em nota à imprensa.



No ano passado, em entrevista a Ana Maria Braga no programa "Mais você", Adriana comentou sua relação com Susana e a luta da mulher contra o câncer. Como atriz, Susana participou de produções como "O gigante da América", de Júlio Bressane, de 1978, e da série "Véu de noiva", exibida pela TV Globo em 1969.



A família de Susana, que trabalhava com ela na divulgação da obra do poetinha, também divulgou uma nota de pesar: “Perdemos nossa matriarca, que como filha primogênita adorada de Vinicius e idolatrada por todos da família, se fez de guia para nos ajudar a suportar e cuidar com responsabilidade da obra do poeta. Linda, culta, inteligente, forte, Susana era nosso esteio, e nos deixa o melhor dos legados, um amor inesquecível e um grande exemplo de mulher”. Junto aos irmãos, ela coordenou as homenagens pelo centenário de Vinicius, em 2013.



A famosa música “Inverno”, composta por Antonio Cicero sobre uma melodia de Adriana, era dedicada a ela — afinal, Susana foi quem estimulou a longeva parceria artística dos dois.



— Dediquei a música a ela, porque a Susana gostou muito quando mostrei. Era uma pessoa encantadora. Era uma companhia inigualável — afirma Antonio Cicero.



No cinema, atuou em produções como “O gigante da américa” (1978), de Júlio Bressane, e na série “Véu de noiva”, exibida pela TV Globo em 1969 — quando a televisão ainda não tinha o alcance de público que tem hoje. O trabalho de atriz, porém, serviu para ver sua verdadeira vocação: a de diretora. Dirigiu o documentário “Vinicius, um rapaz de família” (1980) e o longa “Mil e uma” (1994), selecionado pelo Festival de Veneza daquele ano.



O primeiro curta que dirigiu, sobre Carlos Leão, foi pago com o dinheiro de um quadro de Di Cavalcanti que Susana vendeu. Em 2005, ela ainda produziria o documentário “Vinicius”, de Miguel Faria Jr., com quem foi casada por oito anos. Como diretora, também assumiu os shows “Adriana Calcanhoto — Público” e “Adriana Partimpim Ao Vivo”.



— É uma parte da minha vida que se vai. Ela trabalhou em vários filmes meus, depois foi minha assistente de direção em tantos outros. Administrava a obra do pai com grande zelo, sempre privilegiando a obra em vez de interesses comerciais. Foi uma intelectual muito importante — afirma Miguel Faria Jr.



Sua grande cultura — transitando do campo erudito ao mais popular — é ressaltada por todos que conviveram com ela. Seu primeiro de sete casamentos foi so 19 anos, com um diplomata amigo do pai, 20 anos mais velho. Foi aí que nasceu seu único filho, Paulo. No exterior, conviveu com João Cabral de Melo Neto e Rubem Braga. Ela dizia que seu primeiro casamento foi “melhor que faculdade”. Também aprofundou seu contato com a cultura nas noites regadas a música na casa dos pais — muitos amigos de sua idade, afinal, eram fãs do poetinha.



— Ela herdou do Vinicius a sensibilidade. Ela me conhece desde que eu nasci. Quando trabalhei com ela (no DVD do show “Adriana Partimpim”), havia uma intimidade muito grande. Ela casava áudio e vídeo com grande habilidade — diz o cantor e compositor Moreno Veloso.


Voltou do exterior em 1964, bem no contexto do golpe militar. Virou atriz ali, por conselhos de Tônia Carrero, e logo envolveu-se com a militância contra o regime. Não chegou a envolver-se em ações como assaltos a bancos, mas dava suporte aos movimentos contra a ditadura. Chegou a ser presa, levou “uns tapas dos militares”, mas logo foi solta. Pouca gente sabe, mas ela substituiu Nara Leão no “Opinião” por dez dias, até a chegada de Maria Bethânia, que começou sua carreira no espetáculo.

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A secretária estadual de cultura, Eva Doris Rosental também lamentou a morte dela. Em comunicado à imprensa, Eva definiu Susana como “atriz e cineasta irrequieta”: Perde o cinema, perde nossa cultura, perdemos todos nós”, afirmou.



Susana estava internada na clínica São Vicente, na Zona Sul do Rio de Janeiro, desde o dia 5 de janeiro. Segundo o oncologista Bruno Nahoum, ela faleceu às 5h de ontem, aos 74 anos, vítima de infecção respiratória em decorrência do câncer.

 

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Autor / Fonte: O Globo

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