Audiência Pública debate possibilidade de rompimento de barragens das usinas do Madeira

O deputado Léo Moraes (PTB) foi o proponente da Audiência Pública que aconteceu na manhã desta quinta-feira (5) no Plenário da Assembleia Legislativa, para debater sobre a possibilidade de rompimento das barragens das usinas no rio Madeira. Dentre os convidados o biólogo do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA), Phillip Martin Fearnside

Segundo Léo Moraes, a audiência tem o propósito de ouvir o cidadão e a comunidade para que sejam registrados seus anseios e pleitos de forma legítima, para subsidiar o Legislativo Estadual com elementos que proporcionem aos parlamentares a possibilidade de fazerem um trabalho eficiente, proativo e da maneira mais correta possível, visando a solução de todos os problemas já acarretados ou futuros.

A promotora de Justiça do Meio Ambiente do Ministério Público, Aidee Maria Mozer, disse que o MP de Rondônia, vendo a dificuldade do Estado em ter técnicos suficientes para analisar o Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) apresentado em Brasília pelos dois empreendimentos no Rio Madeira, contratou 20 consultores conceituados e de renomes internacionais para a análise dos estudos das hidrelétricas.

Segundo a promotora, o parecer dos consultores apontou que o EIA RIMA realizado pelas hidrelétricas não era suficiente para garantir a segurança dos empreendimentos. Ela afirmou que o relatório dos consultores, que incluiu o biólogo Philip Martin Fearnside, teria, inclusive, ao ser apresentado ao Ibama, gerado certo desconforto por ter sido considerado melhor do que o EIA RIMA feito pelas hidrelétricas.

Aidee destacou que o MP tem mais de 15 ações ajuizadas sobre problemas que começaram a surgir depois das instalações das usinas e que já eram previstos no relatório dos consultores contratados pelo órgão e que viraram objeto das ações. Informou que o MP também tem 50 inquéritos civis instalados em um grupo de trabalho formado para tratar das questões ambientais e sociais. Disse que todos os reassentamentos realizados pós hidrelétricas apresentam sérios problemas.

“Nosso grupo de trabalho realizou visitas a todas as famílias atingidas de alguma forma pelas usinas, nós conhecemos a realidade, inclusive do distrito de Jaci-Paraná. E acreditamos que essa preocupação com a possibilidade de rompimento só chega agora em razão da tragédia em Mariana”, declarou a promotora do MP.


O diretor da Defesa Civil, capitão Arthur Luiz Santos Dias, disse que em relação ao tema do debate, muito se fala e pouca informação se tem. Que o estudo feito pelo Ministério Público deveria ter sido amplamente divulgado para que a população tivesse acesso a todas as informações que indiquem danos, riscos, acidentes possíveis ou já ocorridos.

Ele sugeriu que os deputados busquem apoio da bancada federal rondoniense no Congresso Nacional para pressionar os representantes a terem um posicionamento contrário a PEC que, segundo o diretor, vai contra o meio ambiente e a sociedade.

O consultor da Energia Sustentável do Brasil (Esbr), Edio da Luz, disse que a empresa sempre se manteve transparente e presente e em todos os momentos em que foi chamada para esclarecimentos e dúvidas a respeito do empreendimento, no caso, a Hidrelétrica de Jirau. Ele disse que, enquanto engenheiro com mais de 40 anos de experiência e estudos, em se tratando de aspecto de armazenamento de água e levando em consideração conceitos de barragens hidráulicas, não tem qualquer cabimento comparar o que aconteceu em Mariana com o que existe no rio Madeira.

O engenheiro explicou que não há hipótese alguma e que, inclusive, pode ser considerado um absurdo no ponto de vista de engenharia a comparação entre hidrelétricas e barragem hidráulica para rejeitos, como a rompida na cidade mineira. Afirmou que cogitar a possibilidade de rompimento das barragens do Madeira, que segundo ele seguem todos os critérios de segurança, é oferecer à sociedade e às comunidades ribeirinhas uma condição de risco alarmante que não existe.

O biólogo do INPA, Phillip Martin Fearnside, afirmou que existe risco de rompimento, mesmo sendo pequeno e em longo prazo. Ressaltou que a possibilidade não significa que as empresas não teriam seguido regras de segurança. Ele apresentou dados técnicos, gráficos, modelos de barragens de outros países e reafirmou que as condições climáticas, em constante mudança, pode ser uma das principais razões que levariam o possível rompimento.

O estudioso destacou as consequências da cheia de 2014 na usina hidrelétrica de Santo Antônio e apontou aspectos como o rebaixamento do reservatório, desligamento das turbinas por restrição hídrica, alteamento de ensecadeiras de jusante, rompimento do ‘Log bom’, acúmulo de sedimento na tomada d’água, inundação de parte do canteiro, problema de vedação dos eixos da turbina.

Segundo Fearnside, a vazão da água máxima em Porto Velho alcançou 60.066 metros cúbicos por segundo em 31 de maço de 2014. Ao se considerar no ajuste de distribuição estatística a cheia de 2014, explicou, a vazão observada de 58.560,00 m/s passa a apresentar um período de retorno equivalente a aproximadamente 113 anos no critério de máximas médias diárias, portanto, 2,6 vezes inferior a antes de sua ocorrência.

O pesquisar explicou a importância de, quando do início do planejamento e construção dos empreendimentos, os consórcios terem levado em consideração os fenômenos associados com o La Nina. Segundo ele, a questão dos processos hidrológicos produzidos por fenômenos climáticos têm uma ocorrência cíclica na escala temporal e suas consequências em termos de produção hídrica e de sedimentos da bacia estão refletidas nas séries hidrológicas históricas, e dessa forma, consideradas nos projetos.

O estudo desses fenômenos, ressaltou o biólogo, é muito mais útil como base para a previsão de clima, de precipitações e de vazões, atividades características da fase de operação das usinas, quando prognósticos de ocorrências futuras de vazões, podem gerar economia e segurança à geração hidrelétrica.

O representante da Associação dos Produtores Rurais do Baixo Madeira, as comunidades ribeirinhas e atingidos pelas enchentes do Madeira, Antônio da Silva, disse que a ausência do Estado, em um primeiro momento foi a maior dificuldade enfrentada pelas vítimas. Segundo ele, o tema do debate não deveria ser o risco de rompimento, mas sim, a falta de preocupação dos grandes empreendimentos com a alienação e a miséria do povo.

Ele ressaltou que o interesse político, infelizmente, se sobrepõe a vontade popular e que dos R$ 32 bilhões destinados para a construção de duas usinas, grande parte foi usada para corromper e fazer os políticos felizes, mas o povo ribeirinho vai continuar na mesma miséria de sempre.

Russlan Magalhães, do Conselho Estadual de Agricultura, opinou para que as faculdades usassem seus alunos para pesquisar mais as reais condições das usinas e tornar isso em conhecimento. Ressaltou que Rondônia ficará somente com o problema social, sem deixar nada para o Estado.

O professor Luiz Novoa, do Departamento de Ciências Sociais da Unir, falou da falta de estudos mais detalhados e aprovações técnicas dos técnicos do Ibama. Segundo ele, Porto Velho está abaixo de duas grandes usinas que representam metade de uma Itaipu e que a discussão de ações de contingência é imperiosa.

Novoa disse que independente de estudos, é fato que após as enchentes de 2014, ficou claro a existência de problemas e que os licenciamentos das duas usinas precisam ser revisto. Para ele, os danos já aconteceram e agora é necessário arcar com as consequências e evitar a simplificação dos licenciamentos como sugere a PEC que está tramitando no Congresso.


Antônio Moura, representante da Cooperativa Cujubim Grande, informou que até os dias atuais existem famílias no Baixo Madeira morando em barracas de lona, porque não conseguiram reconstruir o que tinham anterior às usinas. Disse que nunca, nenhum representante dos empreendimentos ou políticos de Rondônia estiveram no local se compadecendo da realidade do sofrimento dos ribeirinhos com as consequências, que as hidrelétricas trouxeram para suas vidas.

Várias reclamações foram feitas durante a audiências voltadas para o abandono das vítimas das enchentes, os prejuízos a elas acarretados, a necessidade de investir em ações sociais para tirar cerca de 2.800 famílias da miséria. Segundo os relatos, muitas viviam da pesca e de pequenas produções devastadas pelas enchentes.

Em geral, os representantes pedem mais empenho dos deputados para levantar informações do que teria sido feito com os cerca de R$ 90 milhões anuais de compensações repassados para a Prefeitura de Porto Velho e o Estado de Rondônia.

Nas considerações finais, o consultor da ESBR, Edio da Luz, agradeceu o convite para a audiência e disse que uma usina hidrelétrica não tem poder institucional. Segundo ele, não se trata de recursos, pois não se pode passar recurso privado para ente público. Disse que é consciente de que as populações merecem muito mais, mas que isso está além do que os empreendimentos podem fazer.

Ele destacou o pagamento dos royalties, que segundo ele somam por ano mais de R$ 90 milhões e que a ESBR busca viabilizar e estimular a subsistência de comunidades como a de Jaci-Paraná. Disse que a empresa faz tudo o que está dentro dos seus limites e capacidade, no entanto, que não podem fazer políticas públicas. E ao final reafirmou, “com todo o arcabouço da engenharia, não existe risco de rompimento”.

O deputado Jesuíno Boabaid (PMN), disse que já passou à hora de a Assembleia abrir uma CPI para investigar as usinas hidrelétricas, os riscos que oferecem a população de Porto Velho, os danos e prejuízos já causados e o que teria sido feito dos recursos das compensações, onde teriam sido investidos e quem seriam os responsáveis.

“E vale ressaltar que esses recursos não suprem a quantidade de desgraça que essas usinas trouxeram para Porto Velho e Rondônia, de um modo geral. Afetaram apenas nós aqui, pois a energia gerada vai para outros Estados”, declarou Boabaid.

Ao finalizar a audiência pública Léo Moraes lamentou ter que constatar que muitos dos prejuízos e danos já sofridos pós usinas se deu por má gestão pública, seja municipal, estadual, federal, de gestões passadas ou atuais.

O deputado pediu ao consultor da ESBR um relatório com todas as informações técnicas e garantias repassadas durante a audiência que, segundo o parlamentar, serão utilizadas para o conhecimento da população e sociedade civil para esclarecimentos de dúvidas e como forma de acalmar os cidadãos quanto ao receio da possibilidade de tragédias advindas das usinas.

Léo irá convidar o Departamento de Licenciamento do Ibama para reunião onde também será discutida a sugestão do deputado Jesuíno Boabaid, sobre a necessidade de instaurar uma CPI para investigações mais profundas quanto à destinação e investimento dos recursos das compensações ambientais das hidrelétricas.

A Caerd também deverá ser convidada para tratar das condições salutares da água que abastece o distrito de Jaci-Paraná.

O parlamentar agradeceu a presença das autoridades que compuseram a mesa de debates e repudiou o não comparecimento de representantes da Santo Antônio Energia, que enviou justificativa de ausência em razão de compromissos previamente agendados.

Autor / Fonte: Juliana Martins

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